A infância de hoje é muito diferente da que eu vivi. Atualmente, as crianças são vidradas no vídeo-game, nos canais infantis e principalmente no celular, onde o virtual quase se assemelha ao real. Brincam com jogos que na maioria das vezes retratam guerras, ações de bandidos contra policiais, ou seja, que levam meninos e meninas para um mundo repleto de violência.
No meu tempo, assistíamos a desenhos animados, em canal aberto na televisão, como, por exemplo, o do Zé Colméia, Fred e Barney, Scooby Doo, Manda-Chuva, Batman, Vila Sésamo e outros. Eram mais leves, sem violência tão explícita. Criados nesse mundo, principalmente quando ainda morávamos no sertão, tínhamos a possibilidade também de ouvir narrativas voltadas para estórias de Saci Pererê, da Cuca, do Papa-Figo, do Boitatá, da Mula-sem-Cabeça, do Curupira, Lobisomem e Bicho-Papão. Lendas do folclore brasileiro, que minha avó Raimunda, em noites sertanejas, costumava nos contar, levando-nos a flutuar em pensamentos sobre essas fabulosas estórias.
Esses contos quiméricos estão se perdendo no tempo. Hoje, nem as mães e nem as escolas recontam às crianças essas fantásticas e lendárias estórias do nosso folclore. Pouco a pouco, estamos apagando a nossa cultura. É um momento leviano, insensato, que tem que ser repensado por todos nós. Somos culpados, pois muitas vezes fechamos os olhos, preferindo nos cobrir com o manto da inércia. É mais fácil agir assim e jogar a culpa nos outros. Se não cobramos, passamos a ser coniventes com toda essa estrutura, que, impiedosamente, vem aniquilando a cultura de raiz do nosso povo.
Mas esse umbrático folclore, ainda, é forte. Basta caminhar pelo sertão, por suas feiras livres, ouvir a voz do homem do campo, que logo se encontram fascinantes histórias e estórias. Recentemente, uma criança, filho de um amigo, nos acompanhou em meio às bancas e aos frequentadores de uma dessas feiras. Enquanto eu comprava frutas, o menino começou a prestar atenção na conversa de dois caboclos. Um deles perguntou ao outro: ” – O compadre ainda mora no Mufumbo? O outro respondeu: ” – Moro. Lugar longe, lá onde o vento faz a curva.
Deixamos a feira, mas o menino ficou o dia inteiro martelando no seu imaginário. Queria saber onde ficava o lugar localizado “onde o vento faz a curva”. Expliquei que era uma expressão, usada para dizer que o lugar era distante, longe e até, às vezes, de difícil acesso. A feira também é escola. Nela se ensina e aprende muita coisa.
Onaldo Queiroga
