“E o que estava assentado era, na aparência, semelhante à
pedra de jaspe e de sardônica; e o arco celeste estava ao redor do trono,
e parecia semelhante à esmeralda.” (Apocalipse: 4:3)
As máquinas fotográficas só aconteceriam há quase dois milênios no futuro e a arte do retrato pictórico, aquele sob encomenda onde o artista objetiva representar a aparência visual da pessoa, até existia, porém não grafou a efígie do Filho do Homem. A imagem que hoje se vende do rebento de José e Maria é a de um jovem homem esbelto, olhos claros, ora verdes, ora azuis, um plebeu encantador. De onde veio esses atributos ajaezados num corpo esguio, branco e de cabeleira loira do nazareno ninguém diz.
Não há nos evangelhos canônicos nenhuma descrição da fisionomia de Jesus. A religião judaica, berço do Cristo, era contrária à retratação em figura das pessoas por repudiar veementemente a adoração de ídolos ou imagens. De onde surgiram, então, os contornos de um homem branco de cabelos compridos, dourados e de traços finos para adornar a aparência crística?
Nos registros do Novo Testamento o desprezo por qualquer detalhe relativo à imagem de Jesus nos faz entender que o que realmente importava para os seus seguidores era sua mensagem, os seus atos, os seus exemplos. Mas, a nossa vaidade exige que para cada conteúdo precisa-se de uma embalagem. A dádiva presenteada necessita de um alindamento externo. Talvez a satisfação visual já conclua o contentamento do presenteado, sendo dispensável a essência do invólucro.
As características europeias aplicadas ao imaginário visual do Cristo são perseguidas, a princípio, pelo Cristianismo Oriental e hoje, abundante e excessivamente, pelo Cristianismo Ocidental. A ciência já se utilizou de pesquisas em ossadas contemporâneas no habitat de Jesus, na busca de uma possível fisionomia dEle. A resposta veio em uma estatura mediana de 1,60m e 50kg. Já a pele estaria para um judeu iraquiano, ou seja, moreno de cabelos e olhos castanhos. Por isso, sendo um árabe, Jesus compartilharia obviamente do fenótipo dessa etnia.
O Novo Testamento afirma, também, “Belém de Judá” como sendo o local do parto de Maria, assim confirmando que Jesus nasceu em África. Naquele tempo a região da atual Palestina e Cisjordânia perteciam ao território norte africano, só vindo a separar-se com a construção do Canal de Suez em 1859. Ainda no evangelho de Mateus (Mateus 2: 13-23) o apóstolo relata a fuga para o Egito, logo após o natalício do Menino, para defender-se do genocídio de Herodes. E lá Ele viveu por aproximadamente 4 anos. Depois disso não há notícias até os 12.
Portanto, como cenceber a ideia de um menino africano, nascido no século 1 a.C., filho de palestinos e, ainda assim, ser loiro e de olhos azuis? Como Maria e José conseguiriam esconder uma criança loirinha, cabelos lisos e de olhinhos azulados em meio a uma população negra? Como fazer o “galeguinho” passar desapercebido entre egípcios, árabes e judeus que possuem fenótipos étnicos intensamente perceptíveis?
Meus caros leitores, em uma jocosa analogia eu diria que estamos, há séculos, tentando esconder uma criança genuinamente dinamarquesa em uma escola piamente quilombola na Bahia. Jesus Cristo ter sido um homem de cor perturba o status quo religioso predominante, eu sei e você também. Mas, neste Natal de 2023 e nos próximos por toda a eternidade, nos desamarremos dos preconceitos e perguntemo-nos: com todas as evidências históricas apontando para um menino Jesus negro, por que isso incomoda tanto?
Sim, antes que me esqueça de perguntar, como poderia um Papai Noel preto? Respondo com outra pergunta: como pode um Papai Noel de qualquer cor que seja? Afinal, ele não existe mesmo, né? Já não digo o mesmo do aniversariante do 25 de dezembro. Um feliz e colorido natal, nas cores de jaspe e de sardônica, para todos nós!
Francisco Jarismar
Licenciado em História pela UFPB
Servidor Público Federal do IFPB
CONTATO: [email protected]