“Não sei te dizer ao certo qual o problema”. A frase é de Cuca, após pedir uma surpreendente demissão de um trabalho de apenas cinco meses e 26 jogos no São Paulo. Poderia também ser a frase dos 22 técnicos a comandarem o time nos últimos exatos dez anos, quando Ricardo Gomes chegou para o lugar de Muricy em 2009. Poderia ser também a frase de um dos três presidentes ou dez diretores de futebol que passaram nesta década.
Ninguém sabe qual é o problema do São Paulo porque ninguém se preparou para vê-los. Se vence, o técnico e os jogadores são bons e o time irá disputar título. Se perde, técnico não presta e jogadores são descompromissados. Não há critério de avaliação ou convicção. O que motiva as ações é só o resultado, que depende de tantas variáveis que muitas vezes é incontrolável, ou escapa por detalhes. Sem entender porque perde ou o que fazer para ganhar, o clube simplesmente vai apostando e contratando, até uma hora dar certo.
A demissão de Cuca e chegada de Fernando Diniz é apenas um sintoma do equívoco de gestão quando Raí resolve, sozinho, demitir Aguirre e efetivar André Jardine. Nesse momento, o diretor sinalizou não entender os motivos que tinham levado o São Paulo à liderança do 1º turno e os motivos da queda de desempenho. Mostrou não conhecer o modelo de jogo praticado, o dinamismo de Éverton e a falta de opções para repô-lo. Efetivou o técnico para demití-lo após três meses, contratou outro esperando uma coisa.
Não entender porque ganha ou porque perde gera uma crise de expectativa
Expectativa é uma coisa mais influente no futebol do que pensamos. E ela é complicada: expectativa baixa gera surpresa, expectativa alta gera decepção. E expectava errada só vai dar errado. Em algum momento, o preço vem.
Esperavam que Cuca montasse um time posicional, que jogasse com bola no chão e troca de passe, que é justamente o contrário do que ele fazia em seus bons trabalhos no Galo e Palmeiras. Esperavam que Daniel Alves fosse um meia criador sem ver que, nas últimas duas temporadas, ele era um volante que jogava por trás de uma linha criativa e articulava e cadenciava as jogadas. Esperavam que Hernanes e Pato, cheios de problemas físicos, resolvessem as coisas como um passe de mágica.
É óbvio que o resultado é a decepção! E a culpa é da expectativa utópica e errada de que o São Paulo entrou pra disputar título. O resultado é um time que também frusta taticamente: todo mundo avança e fica tocando de lado na frente. Quem realmente está livre para receber a bola e pensar uma finalização de qualidade na imagem abaixo? Quem realmente se movimenta e cria espaço para que o time desorganize a linha defensiva e consiga finalizar?
“Eu queria explicar que todo ser humano tem sua característica, eu tenho a minha. Qual é a característica do Cuca? Eu gosto de marcação na frente, rápido. Não gosto de time que tem morosidade. Às vezes, ser mais objetivo. Infelizmente o meu estilo não casou com o estilo do São Paulo. Não combinou. Não é por isso que eles não são bons, eles são ótimos. Mas não encaixou” – Cuca
O mau aproveitamento em casa não é “acaso”. A escolha pelo modelo propositivo gera também um efeito emocional: se o time não faz o goleiro trabalhar nos primeiros vinte minutos, o jogo vira de lado, porque o adversário se recolhe, cria muito mais dificuldade e explora contra-ataque. Grêmio, CSA e Goiás fizeram isso, assim como o Vasco no Rio. Emocional, pressão, má-fase..bate o desespero e o modo “abafa”: todo mundo vai pra área acreditando no erro do zagueiro ou goleiro. Isso no primeiro tempo, como na imagem.
Tudo está conectado. E tudo pode ser explicado, ao contrário dos que comandam o São Paulo pensam. E a escolha de Fernando Diniz, que tem uma metodologia bem diferente da de Cuca, pode casar com as características do elenco? Pegando os últimos trabalhos, os problemas dos times de Diniz eram OS MESMOS que o do São Paulo. Se você comparar as imagens, vai ver até semelhanças: times ofensivos, que ocupam o campo de ataque, mas pouco dinâmicos. Times que criam muito e finalizam pouco. Times que sofrem no contra-ataque.
Sem linha condutora não há como entender a realidade
Isso significa que Diniz “dará errado”? Não! Futebol é o esporte do acaso e do improviso, e toda análise pode envelhecer mal. A questão é que não há lógica nas ações. Não existe uma linha condutora. Logo, não há como entender os problemas e enxergar as soluções. Não era problema a queda de desempenho com Aguirre, era apenas sintoma de que o elenco precisava ser reforçado. Assim como Dorival precisava de jogadores de velocidade, não um meia de cadência como Nenê ou um jogador pesado como Tréllez.
Assim como Osorio e Rogério Ceni precisavam da continuidade de seus elencos para implementar a filosofia que pretendiam. Assim como Leão sequer deveria ser cogitado, tal como Doriva por “saber vencer o Santos” em 2015, ou Carpegianni por ter feito um bom trabalho em 1999. Não é a apresentação bombástica do grande craque que retorna para sua casa que vai salvar o time. Nem o “pacotão” de jogadores que fizeram gol no São Paulo ou se destacaram no outro ano – lembra deles?
O real problema é não ter planejamento. Não contratar um técnico e entender o modelo de jogo que ele acredita e ele sabe treinar, contratar os jogadores que ele pede e precisa para esse modelo e dar tempo, seja qual for o resultado, para que jogadores assimilem e entendam o modelo. Treino, repetição, erro e acerto – não se faz futebol num passe de mágica. Ninguém sabe mesmo qual é o problema. Porque ninguém quer mudá-lo. E assim Diniz será o próximo culpado, com seus erros e acertos, porque é sempre mais fácil culpar pessoas por serem pessoas num sistema corrompido.
Quem será o próximo culpado?
Fonte: Globo Esporte