No pensar de Pablo Neruda, “saudade é amar um passado que ainda não passou, é recusar um presente que nos machuca, é não ver o futuro que nos convida”. Na verdade a saudade é um vocábulo considerado por muitos intraduzível, inclusive pesquisa promovida por tradutores britânicos o apontam como a sétima palavra mais difícil de tradução.
Mas o fato é que a saudade alimenta as almas dos poetas e, por isso, ela é sempre encontrada nos poemas de amor. Com isso, não vislumbramos a saudade como sinônimo de algo ruim e triste. Ter saudada é recordar de coisas boas e alegres, que nos traz um sentimento sempre presente de felicidade. Lembrar de algo que nos deixa cabisbaixo não é saudade, mas sim pesadelo.
Só sentimos saudade de um tempo em que as lembranças nos remetem a período de vida saudável, com muita paz, harmonia e amor. Muitas vezes no âmago da rotina de uma vida modesta, simples e de um dia-a-dia de convivência com familiares e os mesmos amigos, não visualizamos a felicidade. Todavia, passado esse tempo e começamos a imaginar o quanto éramos felizes e não nos dávamos conta deste sentimento. E é nesta oportunidade que a saudade fala alto, nos remete a pensarmos como seria bom que o tempo voltasse e assim, permitisse a renovação de todo àquele período.
Mas o tempo não retroage. Aliás, não é a toa que Cazuza certo dia cantou que “o tempo não pára”, isso, quem sabe já inspirado em Mário Quintana que também lecionou: “O tempo não pára! Só a saudade é que faz as coisas pararem no tempo”. Mas o importante é que saudade não nos deixe preso ao passado ao ponto de fazer emergir do nosso íntimo o medo do futuro, pois assim estaríamos trucidando a beleza que é viver o presente.
Temos que ter saudade de um tempo que nos permitiu visualizar, por exemplo, uma noite de céu aberto, repleto de estrelas e uma bela Lua cheia. E em meio a tão belo cenário, ter o tempo sido gentil e nos dado o direito de observar o mar que calmamente, no vem e vai de suas ondas, acariciava suavemente as areias da praia. Ali também um poeta, sentado à beira do mar. Nas suas mãos um violão. No seu coração a inspiração, a lembrança de um tempo feliz que ficou para trás. Da sua voz a poesia “saudade”, declamada e acompanhada de sons majestosos que ecoavam das cordas do seu violão.
Saudade é isto. É também lembrar de um tempo em que você tinha condições de deitar sossegadamente em uma rede, se deleitar através da leitura de um bom livro. Viajar pelas as escritas de José Lins do Rego, Ariano Suassuna, Manoel Bandeira, Castro Alves, Guimarães Rosa, José de Alencar, Paulo Coelho e tantos outros literatas.
É também através dela, que percebemos como somos infinitamente pequenos diante da grandeza do tempo. Este sempre criança, e nós continuamente amadurecendo no caminhar da estrada intitulada “sem volta”.
Por isso, jamais deixe que a melancolia lhe maltrate. Aproveite o tempo para buscar a concretização dos sonhos, pois ela, a saudade, é como nos ensina Zeca Baleiro, “é um filme sem cor que meu coração quer ver colorido”.
Gravura de Antônio Ximenes