Um dia após as manifestações de rua em defesa do governo, o presidente Jair Bolsonaro decidiu fazer um afago na direção do Congresso e do Supremo Tribunal Federal, na tentativa de reconstruir pontes. Alertado de que as mobilizações do domingo causaram um mal-estar ainda maior nas relações com o Legislativo e o Judiciário, Bolsonaro convidou os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ); do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e do Supremo, Dias Toffoli, para um café da manhã, nesta terça-feira, 28, no Palácio da Alvorada.
A ideia de Bolsonaro é tentar uma reaproximação com os chefes dos Poderes, propondo um “pacto pelo Brasil” e a favor das reformas da Previdência e tributária, além do apoio a projetos sobre segurança pública, conforme havia sugerido Toffoli, ainda em fevereiro. Nos bastidores, integrantes do Congresso e do Judiciário avaliam que, mesmo com desconfianças em relação a Bolsonaro, é necessário investir rapidamente em um acordo para evitar que as crises política e econômica se aprofundem.
Alvo das mobilizações de domingo, Maia chegou a ser aconselhado nesta segunda-feira, 27, por aliados a dar uma resposta contundente às críticas ao Congresso e ao Centrão com um pronunciamento em defesa do Legislativo. Em reuniões realizadas ao longo do dia, na residência oficial da Câmara, deputados disseram a ele que era preciso marcar posição para mostrar que, sem o Congresso, não há como resolver o problema do desemprego nem como combater a desigualdade social e muito menos ajustar as contas públicas. Pelo roteiro traçado, o discurso seria algo na linha de que não há solução fora da política e do respeito às instituições.
No fim do dia, no entanto, interlocutores de Bolsonaro entraram em cena e tentaram apagar o novo incêndio com o convite para uma conversa, nesta terça, que também terá a presença dos ministros Onyx Lorenzoni (Casa Civil), Paulo Guedes (Economia) e Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional).
Embora numericamente as manifestações do domingo tenham sido consideradas expressivas, o Planalto admite que houve estragos no Congresso por causa dos ataques a Maia, ao Centrão – grupo de partidos que reúne cerca de 230 dos 513 deputados – e à classe política em geral, feitos pelo próprio Bolsonaro. No domingo, ele disse que as manifestações deram um recado “às velhas práticas” da política que não deixam o povo se libertar. Nas redes sociais, o presidente classificou a mobilização, em todo o País, como “espontânea”. “O que vimos ontem (domingo) foi extremamente significativo e histórico. Não podemos ignorar”, comentou ele.
‘Troco’. A portas fechadas, Bolsonaro avaliou, porém, que exagerou em suas observações ao bater na tecla das “velhas práticas”. Lembrou, contudo, que sempre foi atacado quando era deputado federal e sobreviveu ao “bombardeio”. A preocupação do Palácio do Planalto, agora, é com a reação do Congresso e possíveis “trocos” em votações no plenário. O governo teme, ainda, que o Legislativo aprove projeto para diminuir os poderes do presidente na edição de medidas provisórias.
Por enquanto, o receio diz respeito à MP da reforma administrativa, que reduz o número de ministérios de 29 para 22 e perde a validade em 3 de junho. Apesar de aprovada pela Câmara, a medida ainda precisa passar pelo crivo do Senado.
Mesmo com o pedido de Bolsonaro para que nada seja mais mexido nesse texto, o líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), disse que fará de tudo para manter o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sob controle do ministro da Justiça, Sérgio Moro.
A Câmara aprovou a transferência do Coaf para o Ministério da Economia. Caso isso seja alterado, a MP terá de ser apreciada novamente pelos deputados e pode não haver tempo hábil para aprovação até o dia 3, o que obrigaria o governo a recriar ministérios extintos, como Trabalho e Cultura.
Maia recebeu nesta segunda o ministro do STF Gilmar Mendes, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), líder da Maioria, e o ex-deputado Chico Alencar (PSOL), entre outros. O presidente da Câmara está certo de que Bolsonaro – e não apenas o PSL – está por trás dos ataques ao Congresso nas redes sociais.
“Os atos sinalizam o prolongamento da crise política. Bolsonaro atua por um terceiro turno”, disse o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP). “O Brasil precisa de um pacto pelo desenvolvimento nacional e pela democracia. Ou seremos parte de uma saída para o País ou seguiremos com nossas verdades, de costas para o sofrimento do povo.”
Fonte: Estadão