A fiação exposta no teto do subsolo do antigo Hotel Hilton, em Caracas, é o primeiro indicativo de que as coisas não vão bem no local que já foi referência de luxo no país. Estatizado pelo então presidente Hugo Chávez, em 2007, o local virou Hotel Alba e, sem hóspedes frequentes, tornou-se sede das principais reuniões e eventos do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), legenda que sustenta o regime chavista há 13 anos.
Acuado após as manifestações lideradas pelo líder da oposição Juan Guaidó desde 30 de maio e com o país assolado pela crise econômico-social e sem base de apoio sólida, o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, agiu em duas frentes: endureceu a repressão e a censura e convocou um congresso do PSUV no antigo Hilton, para fazer “retificações à revolução”.
VEJA esteve no encontro, realizado no último domingo 5, e não encontrou uma multidão de militantes chavistas, como Maduro anunciara em suas redes sociais. Deputados e dirigentes do PSUV, como Diosdado Cabello, importante liderança do regime, estiveram no encontro, que teve um supreendente tom de autocrítica.
“Funcionários do governo que não atendam ao povo devem ser substituídos”, discursou Cabello, vice-presidente da Assembleia Constituinte.
Coube a Eduardo Piñate, ministro do Trabalho e secretário-executivo do PSUV, o discurso mais forte em favor da legenda. “O chavismo não é um produto de marketing. Temos força moral”, afirmou com firmeza para uma plateia pouco entusiasmada e para as câmeras da TV estatal.
Depois do evento, a VEJA, Piñate deu explicações sobre as “retificações” necessárias ao chavismo. “Nós cometemos muitos erros. Perdemos as eleições da Assembleia Nacional por causa dos embargos econômicos, mas não só por isso. Nós também erramos muito. Temos uma batalha pela frente contra a negligência e a corrupção”, afirmou.
A autocrítica de um membro do alto escalão do governo de um país convulsionado pela crise parou por aí. “A direita fala da corrupção, e essa precisa ser combatida com muita força. Mas a corrupção hoje é infinitamente inferior àquela que existia quando eles estavam no poder”, comparou.
Pinãte evitou fazer comentários sobre os posicionamentos do governo brasileiro diante da crise da Venezuela (“fazem aquilo que os Estados Unidos manda”), mas direcionou suas críticas à Juan Guaidó, inimigo número 1 do chavismo. Aposta que o líder da oposição irá “desaparecer”.
“É incapaz, apenas um soldado do governo dos Estados Unidos. É um operador político do imperialismo, um produto criado por publicitários. Nós estamos nas ruas o tempo todo”.
Naquele dia, Guaidó convocou uma vigília no centro de Caracas para orações em memória das vítimas da repressão do governo Maduro. Desde os protestos de 30 de abril, cinco pessoas foram mortas pelas forças de segurança. Sobre essas mortes, a censura e a repressão do governo, não houve comentários de Piñate nem de qualquer membro do PSUV. A autocrítica teve seus limites.
Fonte: Veja