Nesta sexta-feira, 23, a Justiça Federal do Paraná retirou o sigilo de parte da delação premiada de Antonio Palocci, ex-ministro dos governos Lula e Dilma. Desde o início, a delação causou desconfiança pela falta de comprovações sobre o que era dito. O acordo acabou sendo fechado com a Polícia Federal em 2018. A publicação dos autos vem no âmbito da Operação Pentiti, deflagrada também nesta sexta pela Polícia Federal. Esta é a 64ª etapa da Operação Lava Jato. Segundo Palocci, Lula via na exploração do pré-sal uma oportunidade não só para o desenvolvimento do país, mas também uma nova forma de arrecadação de recursos para financiamento eleitoral. De acordo com o delator, num primeiro momento, o objetivo era garantir a eleição de sua sucessora, Dilma Rousseff e, num segundo, financiar seus próprios anseios políticos. O ex-presidente também fazia a gestão política do projeto.
Palocci conta que se reuniu no Palácio da Alvorada com Lula, Dilma e o ex-presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli. Lula teria sido expresso ao solicitar que Gabrielli encomendasse a construção de 40 sondas para garantir o futuro político do país e do PT com a eleição de Dilma. O ex-ministro diz que Lula, na mesma reunião, afirmou que caberia a ele gerenciar os recursos ilícitos que seriam gerados e o seu devido emprego na campanha. “Esta foi a primeira reunião realizada por Luiz Inácio Lula da Silva em que explicitamente tratou da arrecadação de valores a partir de grandes contratos da Petrobras”, segundo o delator.
Palocci, entre 2009 e 2010, incumbiu-se da arrecadação para a campanha de Dilma. Ele havia deixado o ministério da Fazenda em 2006, em meio ao escândalo do Mensalão, e passou a trabalhar nos bastidores do PT. Depois, em 2011, com Dilma eleita, assumiu como ministro-chefe da Casa Civil.
Disputa entre Dilma e Lula na Sete Brasil
Havia um imbróglio envolvendo as empreiteiras e a Petrobras na Sete Brasil, empresa criada por fora dos balanços da estatal para construir as sondas de exploração do Pré-Sal. A primeira licitação para a construção do navio-sonda foi vencida pelo Estaleiro Atlântico Sul pelo valor de 630 milhões de dólares, um deságio de 10% em relação ao preço do leilão. As empreiteiras não gostaram e cobraram de Gabrielli uma solução, pois o valor tornava a construção dos navios inexequíveis. Dilma afirmou que nada poderia fazer pelas empresas. A saída foi forçar a Petrobras contratar o afretamento dos navios, feito pelas empreiteiras Queiroz Galvão, Seadrill, Petroserv, Odrebrecht Óleo e Gás e Consórcio Atlas (Piemonte, Etesco e OAS), além de uma subsidiária da Petrobras no exterior. Isso traria facilidades às empresas, pois os preços dos afretamentos tinham margens maiores. Como um de seus últimos atos, Gabrielli aceitou a contratação das empresas.
Em 2012, após a troca de comando da Petrobras, a nova presidente Maria das Graças Foster, determinou uma auditoria no programa. Segundo Palocci, era o começo da disputa entre os grupos de Dilma, da qual Foster fazia parte, e de Lula. “A disputa iniciava-se pela próxima campanha à presidência do PT”, segundo ele. A jogada de Dilma bloqueou os recursos do ex-presidente na Sete e, de acordo com o ex-ministro, Lula ficou profundamente irritado. A partir desse momento, diz Palocci, Lula o afastou do comando político do projeto e assumiu a gestão.
Estava em jogo um importante esquema que irrigaria as campanhas em 300 milhões de reais, garantidos por Emílio Odebrecht a Lula. Esse volume de recursos estava disponibilizado para as campanhas de 2010 e 2014 desde que os esquemas da empreiteira continuassem a acontecer. Além do projeto do pré-sal, outras exportações de serviços da Odebrecht entraram no pacote, como os contratos com Angola e Cuba, conforme mostrou reportagem de VEJA.
Pagamentos a João Santana e Mônica Moura
A delação de Palocci mostra também que ele assumiu total responsabilidade pelos pagamentos a João Santana e Mônica Moura, marqueteiros das campanhas petistas. No entanto, na operação de hoje, a Polícia Federal indica que Mantega foi peça importante no esquema. “Guido Mantega teve, ao que indicam as provas produzidas em esfera policial, responsabilidade pela autorização de pagamentos na ordem de 15,2 milhões de reais a João Santana e Mônica Moura em virtude do relacionamento espúrio da Odebrecht com o Partido dos Trabalhadores/Governo Federal e materializado em planilhas que retratavam a existência de uma verdadeira ‘conta corrente geral de propinas’.”
Na quarta-feira, 21, o juiz Luiz Antonio Bonat, da 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba, mandou colocar tornozeleira eletrônica no ex-ministro Guido Mantega. O monitoramento foi determinado no âmbito da Operação Carbonara Química, 63ª fase da Lava Jato. A investigação mira o pagamento de propinas a Mantega e a Antonio Palocci em troca da edição de medidas provisórias para beneficiar o grupo Odebrecht.
Esteves cuidava das contas de Lula
Num dos pontos da delação que foram abertos, Palocci discorre sobre a relação próxima entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o banqueiro André Esteves, dono do banco BTG. Segundo o ex-ministro, Esteves possuía a particularidade de ser um operador de recursos pessoais de Lula. Nos autos, a Lava Jato mostra que, entre 2011 e 2016, Lula se encontrou com André Esteves 28 vezes, algumas delas com Guido Mantega, ex-ministro da Fazenda, e outras com José Carlos Bumlai, amigo pessoal do ex-presidente.
“Indagado por qual motivo a pessoa de ANDRÉ ESTEVES estava associada tanto ao ex-Presidente LULA quanto ao COLABORADOR [Palocci], respondeu que ANDRE ESTEVES possuía a particularidade de ser um operador de recursos pessoais de LULA, conforme já detalhado nos Termos de Colaboração lavrados por ocasião da celebração do acordo celebrado com a POLÍCIA FEDERAL; QUE, além disso, ANDRÉ ESTEVES também tinha proximidade do COLABORADOR em razão dos projetos lícitos e ilícitos que mantinha com o Governo, como, por exemplo, seu envolvimento na SETE BRASIL, projeto do qual o COLABORADOR tinha intensa participação;”, segundo trecho do depoimento de Palocci.
Fonte: Veja