Prestes a completar 60 anos, os últimos 14 à frente da presidência boliviana, Evo Morales está diante de sua quarta e mais complicada eleição. Pela primeira vez, arrisca-se a passar para o segundo turno, o que, segundo as pesquisas de opinião, seria um empecilho para a reeleição. No comício de encerramento da campanha, em El Alto, nos arredores de La Paz, era visível a preocupação de Evo:
“Peço mais cinco anos para terminar as grandes obras. Não me abandonem no dia 20 de outubro.”
O presidente da Bolívia saiu vitorioso nas três últimas eleições no primeiro turno, com mais da metade dos votos. Para se reeleger no domingo, precisa obter mais de 40% dos votos e dez pontos de vantagem sobre o segundo colocado ou 50% mais um dos votos válidos.
As pesquisas sugerem que ele tem 32%, apenas cinco pontos à frente de seu principal concorrente, o ex-presidente Carlos Mesa, de 66 anos, do Comunidade Cidadã. Na possibilidade de um segundo turno entre os dois, o atual presidente perderia, segundo as sondagens.
O descontentamento dos eleitores se deve pela insistência de Evo a desafiar o limite de mandatos. Em 2016, os bolivianos rejeitaram, em referendo, a reeleição indefinida, mas o presidente ignorou o resultado: conseguiu que o Tribunal Constitucional anulasse o referendo e abrisse o caminho para uma nova candidatura.
É essa pecha de presidente vitalício que ameaça agora, de forma inédita, o ex-cocaleiro Evo Morales. É verdade que desde que ele assumiu a presidência, em 2006, a Bolívia registrou um crescimento de sua economia em torno de 5% ao ano e queda da pobreza de 60% para 34%.
As bonanças que caracterizaram os primeiros anos de governo, quando setores estratégicos do país foram nacionalizados, começam a se escassear. Em cinco anos, a receita de petróleo e gás foi reduzida de 35% para 20%. O déficit público cresceu e já representa 8% do PIB. O próximo mandato presidencial exigirá da população um programa de ajustes fiscais.
Embora envolvido em escândalos de corrupção, o presidente socialista deu ao país um destino diferente em relação à Venezuela, que sobrevive à gestão de Nicolás Maduro mergulhada em hiperinflação e desabastecimento.
Enfrenta, porém, o desgaste provocado pela crise ambiental que eclodiu dois meses antes das eleições. Incêndios florestais na região agropecuária de Santa Cruz consumiram rapidamente dois milhões de hectares.
O presidente se recusou a declarar emergência nacional para não ter que “pedir esmola às potências mundiais”. Vestiu-se de bombeiro, auxiliou no combate aos fogos e chegou a se perder na floresta. Evo não conseguiu evitar as sequelas políticas: a oposição o responsabilizou pela tragédia por ter autorizado as queimadas.
Sua campanha foi calcada nas benesses econômicas de seu governo. A de seu principal adversário, Carlos Mesa, ressaltou o autoritarismo nos últimos 14 anos. Evo Morales deu impulso à Bolívia, mas se aferrou ao poder. É o tamanho desse desgaste que está em jogo no domingo.
Fonte: G1