A Justiça alemã marcou para outubro o julgamento de um ex-membro da SS (organização paramilitar durante o regime nazista) de 92 anos por cumplicidade na morte de 5.230 prisioneiros no campo de concentração de Stutthof, no atual território da Polônia, afirmaram promotores nesta quinta-feira (8). Esse deve ser um dos últimos julgamentos de crimes nazistas.
Guarda no antigo campo de Stutthof, Bruno D. é acusado de envolvimento em assassinatos cometidos entre agosto de 1944 e abril de 1945, período em que atuou no local, que ficava perto da então cidade alemã de Danzig (hoje Gdansk). Segundo a porta-voz da Promotoria de Hamburgo, ele fez uma confissão parcial dos atos.
Bruno D. integrou a máquina “de assassinatos em massa” no campo de concentração por meio de sua condição de guarda da SS, de acordo com a Promotoria, quando tinha entre 17 e 18 anos.
Segundo o jornal alemão “Die Welt”, o réu reconheceu que atuou no campo de concentração e admitiu que viu pessoas sendo levadas para serem executadas em câmaras de gás. Ele argumentou, no entanto, que isso não significa que ele seja culpado.
Em depoimento à promotoria, Bruno D. afirmou que nunca foi um nazista e que só foi designado como guarda no batalhão SS-Totenkopfsturmbahn, que dirigia o campo de Stutthof, por causa de um problema do coração.
“Eu sabia que eram judeus e não cometeram crimes, que estavam lá apenas por serem judeus. E eles tinham o mesmo direito de viver e trabalhar livremente como qualquer outra pessoa”, admitiu ele no depoimento, segundo o “Die Welt”.
O promotor afirma que, apesar de o réu não ser um admirador fervoroso da ideologia nazista, ele nunca defendeu os perseguidos e, à época, acreditava que poderia sobreviver se apenas cumprisse ordens.
Para acusar o suspeito de cumplicidade, a Promotoria argumenta ainda que, sem guardas armados para impedir tentativas de fuga, os crimes cometidos no campo de concentração não seriam possíveis.
Devido à idade que Bruno D. tinha quando começou a trabalhar no campo, o processo será analisado por um Tribunal Juvenil (equivalente a um Juizado da Infância e da Juventude no Brasil). Se for considerado culpado, ele pode ser condenado à prisão.
Dado o estado de saúde frágil do réu, as sessões judiciais serão limitadas a cerca de duas a três horas por dia. O julgamento deve se estender até dezembro.
Stutthof foi construído em 1939 e utilizado para várias finalidades. Inicialmente era o principal ponto de coleta para poloneses judeus e não judeus da cidade de Danzig.
A partir de 1940, foi usado como um chamado “campo de trabalho educativo”, para onde trabalhadores forçados – especialmente cidadãos poloneses e soviéticos que haviam fugido de seus opressores nazistas – eram enviados para cumprirem suas sentenças, morrendo no local.
Outros detentos incluíam criminosos condenados, prisioneiros políticos, homossexuais e testemunhas de Jeová.
A partir de meados de 1944, foram enviados a Stutthof dezenas de milhares de judeus retirados de guetos pelos nazistas nos países bálticos, assim como de Auschwitz, que estava superlotado, além de milhares de civis poloneses expulsos durante a brutal opressão do Levante de Varsóvia.
Estima-se que cerca de 65 mil pessoas, incluindo muitos judeus, tenham sido mortos em Stutthof. Muitos foram baleados na parte de trás da cabeça, e outros morreram em câmaras de gás.
Processos tardios
A acusação formulada pela Promotoria de Hamburgo faz parte de uma série de julgamentos tardios realizados nos últimos anos na Alemanha por crimes cometidos durante o nazismo.
Os processos se basearam no julgamento do ex-guarda ucraniano John Demjanjuk, que foi condenado em 2011 a cinco anos de prisão por cumplicidade nas mortes no campo de Sobibor, também na época da ocupação da Polônia pelos nazistas.
Demjanjuk, que após a Segunda Guerra Mundial viveu durante décadas nos Estados Unidos até ser extraditado à Alemanha, acompanhou o processo em uma maca, não chegou a prestar depoimento e morreu meses depois de ouvir a sentença em um asilo para idosos.
O processo e condenação de Demjanjuk abriram as portas para outros julgamentos por cumplicidade no genocídio, geralmente envolvendo nonagenários e marcados por frequentes interrupções por razões de saúde dos acusados.
Fonte: G1