Após quase 9 horas de uma conturbada sessão, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma da Previdência foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (23).
Apesar de a oposição ter conseguido, com obstruções, atrasar o calendário da equipe de Paulo Guedes, essa foi a primeira vitória no Congresso do texto entregue aos parlamentares por Jair Bolsonaro há dois meses.
Foram 48 votos a favor e 18 contrários ao relatório do deputado Marcelo Freitas (PSL-MG), que é favorável à PEC 6 de 2019.
O avanço só foi possível após a equipe econômica entrar em acordo com o Centrão. Foram retirados 4 pontos da proposta original: o fim do pagamento de multa do FGTS para aposentados; a exclusividade da Justiça Federal do Distrito Federal para julgar processos contra a reforma e o dispositivo que garante somente ao Executivo a possibilidade de propor mudanças na Previdência.
Também caiu a possibilidade de se alterar, por projeto de lei, a idade máxima da aposentadoria compulsória, o que poderia afetar indicações para ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
Freitas apresentou uma complementação de voto com uma réplica de 13 votos apresentados em separado na comissão. “Não vemos desidratação da reforma. Vamos manter um valor saudável para economia. Qualquer outra coisa poderá ser alterada na comissão especial”, disse a jornalistas antes da reunião no colegiado.
A complementação foi lida no fim da tarde, após o colegiado derrubar requerimento para retirar a PEC da pauta. “Importa-nos valorizar o consenso e entendimento majoritário nessa comissão e dar prosseguimento na tramitação da proposta com urgência”, disse na leitura. O relator ressaltou que manteve a essência da proposta.
O texto agora segue para comissão especial, que terá 40 sessões do plenário para votar um parecer. No colegiado, serão feitas mudanças no conteúdo. Pontos como mudanças na aposentadoria rural e no BPC (benefício de prestação continuada) podem ser retirados. A comissão estava prevista para ser instalada em 7 de maio, mas pode ser adiantada para a próxima quinta-feira (25), a depender do ritmo dos trabalhos.
A etapa seguinte é no plenário da Câmara, onde a PEC precisa de 308 votos, em dois turnos, para ser aprovada. Se isso acontecer, o texto segue para o Senado. Governistas estimam concluir a tramitação na Casa até 15 de julho.
Oposição tenta atrasar mais reforma da Previdência
Foi uma longa sessão, em que deputados do PT, PSol e PCdoB, principalmente, tentaram tentaram atrasar ainda mais a votação com requerimentos e questões de ordem. A tática já vinha sendo usada nas últimas semanas.
O presidente da CCJ, Felipe Francischini (PSL-PR), negou os pedidos apresentados nesta terça e limitou o tempo para os questionamentos.
“Não vou aceitar que fiquem gritando. Isso daqui não é feira”, respondeu. Governistas também fizeram coro. “Não é possível ficar usar meios procrastinatórios para empurrar essa discussão com a barriga”, disse a líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-PR).
A reunião começou às 15h, meia hora após o horário previsto, com apresentação de questões de ordem da oposição para evitar o debate. Um dos argumentos foi o sigilo de informações sobre a proposta decretado pela equipe econômica. “Como dados de uma proposta dessa magnitude para a sociedade brasileira são sigilosos? (…) Fere frontalmente a Constituição da República”, criticou a deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR).
Parlamentares contrários à reforma também recorreram à Justiça para barrar a votação até que a equipe econômica detalhe os dados usados para elaborar a PEC.
Na segunda-feira (22), PSol, PT, PDT e o PCdoB entraram com um mandado de segurança coletivo, com pedido de liminar, para que as informações sejam tornadas públicas. A ação, protocolada na Justiça Federal do Distrito Federal, pede também a suspensão de qualquer deliberação da CCJ até que o Ministério da Economia libere todos os dados da reforma.
Também houve um esforço para apresentar um requerimento que poderia suspender a tramitação por 20 dias. A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), líder da minoria, anunciou ter recolhido as 110 assinaturas necessárias pedindo a suspensão.
Cerca de uma hora depois, no entanto, Francischini disse ter sido informado de que havia apenas 99 assinaturas. Houve tumulto e o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) disse que se tratava de um golpe dos governistas.
De acordo com Feghali, a vitória do governo na CCJ não é o fim da disputa. “Essa batalha não acaba hoje nem amanhã (…) o governo não teve condição sequer de manter o relatório original. Não teve força para isso”, destacou.
O Ministério da Economia decretou sigilo sobre estudos e pareceres técnicos que embasaram o texto. O secretário especial da Previdência, Rogério Marinho, disse que esses dados da reforma seriam liberados após a votação da proposta na CCJ.
As alterações feitas no texto para contemplar demandas de partidos da base não terão impacto no resultado fiscal, de acordo com Marinho. A previsão da equipe econômica é de uma economia de RS 1,164 trilhão em 10 anos, se a PEC for aprovada sem alterações, o que é improvável.
A aprovação da reforma é considerada crucial pela equipe do ministro Paulo Guedes (Economia) para a recuperação das contas públicas. Defensores das mudanças sustentam que sua aprovação irá elevar a confiança do mercado, o que resultará em mais empregos e melhoria de renda.
Em 2018, o déficit total da Previdência foi de R$ 290 bilhões. O valor inclui o INSS, sistema dos trabalhadores do setor privado, os Regimes Próprios dos Servidores Públicos (RPPS) e o sistema dos militares.
Quem é contra a PEC afirma que ela afetará os mais pobres, incluindo trabalhadores rurais. Há também divergências sobre regimes diferenciados para categorias como servidores públicos, professores, militares e profissionais da área de segurança.
Principais pontos da reforma da Previdência
A reforma proposta pelo ministro Paulo Guedes estabelece uma idade mínima de 65 para homens e 62 para mulheres obterem o benefício no INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), com um tempo mínimo de contribuição de 20 anos para ambos. Os brasileiros que ganham acima de um salário mínimo precisarão contribuir por 40 anos para receber o valor integral.
Já os servidores terão que comprovar 25 anos de serviço e a idade mínima subirá, progressivamente, até 2031, quando será igual à do regime geral. A alíquota de contribuição da categoria, hoje em 11%, irá variar, de acordo com o salário, entre 7,5% e 16,79%.
Na aposentadoria rural, a idade mínima passa a ser de 60 anos para mulheres e homens. Hoje é de 55 e 60 anos, respectivamente. O tempo de contribuição mínimo sobe de 15 para 20 anos.
A PEC muda também as regras do BPC, no valor de um salário mínimo (R$ 998 em 2019). Ele é pago a deficientes e brasileiros acima de 65 anos com renda por pessoa da família inferior a 1/4 do salário mínimo. A proposta do governo é pagar o valor integral acima dos 70 anos. Aos 60 anos, eles receberiam R$ 400 em valores de 2019.
Fonte: HUFFPOST