Vinícius Lins era apaixonado por realizar sonhos: os dele e dos outros. Estava com o casamento marcado para dezembro deste ano – parte dos contratos da festa já estava fechada – e tinha começado a cursar o doutorado em Ciências de Materiais uma semana antes de adoecer de Covid-19. Mas ele não resistiu à doença e morreu aos 36 anos.
(Esta história faz parte da série Planos interrompidos, que conta projetos e sonhos de pessoas que morreram vítimas de Covid-19.)
Professor por vocação e amor, Vinícius deixou também para trás seus alunos de química, disciplina que lecionava em escolas de João Pessoa. Ficaram a saudade e os sonhos para serem sonhados ao lado da noiva, Thaysla Godoi.
Quem conhecia Vinícius de perto, como Paulo Neto, cunhado dele, conta que era uma pessoa extremamente inteligente e dedicada à profissão. De uma família de quatro irmãos, nasceu em Pedra Branca, no interior da Paraíba, e ainda muito jovem chegou em João Pessoa para estudar.
Desde a adolescência sabia que o Vale do Piancó, por mais que fosse a terra dele, não lhe daria as mesmas oportunidades de uma capital. Chegou sozinho em João Pessoa, morou na residência universitária por algum tempo e em 2004 recebeu o restante da família para completar a morada.
Formado em química, concluiu o mestrado e cursava doutorado na Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Descrito como um cara divertido, amigo, justo, que passou por diversas dificuldades na vida e que tentou aprender com cada uma.
Gostava de cozinhar enquanto bebia, levava o café na cama da noiva, preparava o almoço e o jantar enquanto Thaysla relaxava. “Era um homem intenso”, lembra a noiva.
Vinícius também deixou uma filha de dez anos, do seu primeiro casamento.
“Quando comecei a namorar com minha esposa, ela me disse uma frase que nunca me esqueço: ‘Gostei de você porque você tem característica do meu irmão e eu o amo muito’. Eu respeito e admiro muito isso”, revela Paulo Neto.
Vinícius era padrinho do casamento de Paulo. E, para retribuir e renovar a amizade, Paulo Neto também havia sido convidado para apadrinhar o casamento de Vinícius com Thaysla. Não deu tempo. Mas Vinícius já parecia saber. Segundo Paulo, ele sempre disse que iria morrer cedo. “Ele não ligava muito para finanças, não era muito controlado. De vez em quando, a gente brincava, alguém falava alguma coisa, que ele tinha que parar de gastar dinheiro. E ele dizia: ‘Eu vou gastar porque eu vou morrer cedo’”, conta Paulo. Mas ninguém esperava que seria verdade.
Uma semana até a morte
Na última conversa com Vinícius, Paulo deixou a esperança. No outro dia, já não tinha mais ninguém para responder.
Fazia uma semana que Vinícius estava com a Covid-19 quando morreu. Com a antecipação dos feriados na Paraíba, ele viajou com a família para um sítio na cidade de Pedra Branca. Durante a viagem, já estava com tosse e cansaço. Não tinha plano de saúde e achava que pelo SUS não seria bem atendido. Por isso, adiou a ida ao hospital.
Os feriados acabaram no domingo. Na segunda-feira, já em casa, Vinícius apresentou febre. Na terça, começou a urinar sangue e decidiu procurar um médico. O teste de Covid deu positivo e o protocolo de remédios começou a ser administrado. No entanto, a doença foi evoluindo. Na sexta-feira, fez uma tomografia de tórax e descobriu que estava com 50% do pulmão comprometido.
Foi, então, convencido a ir a uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), onde ficou em observação. No sábado, chegou a ligar para a noiva pedindo que fosse buscá-lo, mas ele não estava liberado. Paulo foi até a unidade de saúde e o encontrou com uma máscara de oxigênio. Vinícius se emocionou, mas não conseguia falar por causa da tosse. À tarde, Paulo chegou a enviar uma mensagem ao cunhado, mas não teve mais resposta.
Última conversa entre Paulo Neto e Vinícius — Foto: Reprodução/WhatsApp
‘Se essa questão de alma gêmea existe…’
Thaysla Godoi agora transborda de saudade. A vida foi generosa com o casal, mas a partida é sempre muito dura. Em 2010, ela foi aluna de Vinícius. Nessa época, ele estava sendo pai, era casado e Thaysla cursava o terceiro ano do ensino médio, procurando se identificar com alguma disciplina para prestar vestibular. “Através das aulas dele e algumas dicas que ele me deu, eu escolhi fazer química”, revela.
Por volta do ano de 2017, Vinícius deixou uma escola onde trabalhava e Thaysla foi chamada para substituí-lo. Era a aluna preenchendo o lugar deixado pelo professor que a direcionou para um futuro anos atrás. Na mesma época, começou a dar aulas também na mesma escola em que ele era professor. Juntando os caquinhos de duas separações, os dois fizeram sua própria história. Na semana que Vinícius morreu, o relacionamento tinha completado dois anos.